Opinião: Artífices do Porvir, por José Marques de Melo
Marques de Melo na sede do Intercom em SP foto @cultmidia 2015 |
Confesso que vacilei, antes de aceitar o convite de Fernando Haddad, então ministro titular da pasta da Educação, para presidir a comissão encarregada de elaborar as diretrizes curriculares para os cursos de jornalismo, que deixavam de ser habilitação do polivalente curso de comunicação social. Minha relutância decorria da polarização existente na categoria profissional dos jornalistas.
Num extremo, perfilavam os “anacrônicos”, advogando uma formação evolutiva, ancorada no passado mítico da nossa profissão. No outro, estavam os “modernosos”, fissurados no “aqui e agora”, ignorando os processos. Um contingente relativizando a história configurada e o outro desdenhando a história em movimento. Enquanto refletia sobre o argumento usado pelo ministro, que enaltecia o papel crucial do jornalismo no fortalecimento da nossa episódica democracia, passei a limpo minha própria experiência.
Recordo que me engajei no curso de jornalismo, em 1961, seduzido pelas oportunidades cognitivas que o currículo da Universidade Católica de Pernambuco me oferecia no terreno historiográfico.Aquilo que meus colegas de classe julgavam exagerado eu considerava insuficiente, buscando fontes complementares para suprir o que desconhecia.
Segundo o programa de ensino, devíamos começar pela História Antiga (fincando os pés no mundo greco-romano) e percorrer as veredas das formações sociais europeias (História Medieval) para só então percorrer o fascinante universo das sociedades que nos formaram culturalmente (História Moderna e Contemporânea). Nosso currículo, em grande parte circunscrito ao espaço euro-latino, sonegava informações sobre as sociedades orientais, o mundo afro-asiático e o continente americano, inclusive o Brasil.
Em compensação, estudamos a história da Igreja Católica, avançando pela história das encíclicas papais, especialmente a Rerum Novarum de Leão XIII, e os Decretos Pontifícios, em particular, Miranda Prorsus de Pio XII e Inter Mirifica de Paulo VI. Mas o grande ausente do nosso aprendizado foi a história do jornalismo. O conteúdo sobre o desenvolvimento da imprensa ficou restrito às controvérsias sobre os primeiros produtos da imprensa pernambucana.
Os tempos mudaram, porém cresceu o déficit historiográfico nas escolas de jornalismo. Ao pesquisar o conteúdo das disciplinas incluídas nas grades curriculares de algumas universidades, para avaliar a aplicação das novas DCN, fico estarrecido com o desprezo de jovens professores pelas questões holísticas, favorecendo um tipo de formação tecnocrática. Ignorando o contexto das notícias, cultivam um ambiente artificialmente contemporâneo.
Desta maneira, os jornalistas de hoje deixam de ser artífices do porvir. Ignorando o enraizamento das narrativas do presente em fatos que motivaram as manchetes do passado, desdenham a oportunidade de figurar como “testemunhas oculares da história”!
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