O novo decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o acordo para solucionar a polêmica criada em torno do 3º Plano Nacional de Direitos Humanos mantém um artigo que desagrada a área militar do governo. Apesar do novo decreto estabelecer mudanças solicitadas pelos militares, o texto preservou o artigo que determina à Comissão da Verdade "identificar e tornar públicas as estruturas utilizadas para a prática de violações de Direitos Humanos, suas ramificações nos diversos aparelhos do Estado e em outras instâncias da sociedade".
As Forças Armadas haviam reagido contra esse trecho do decreto, mas Lula não recuou. Em contrapartida, o presidente acatou a principal reivindicação dos militares para que a Comissão da Verdade, que vai investigar crimes cometidos no período da ditadura (1964-1985), restrinja as apurações às "violações de direitos humanos" praticadas no período.
Inicialmente, o primeiro decreto de Lula estabelecia a investigação de violações de direitos humanos praticadas no contexto da "repressão política" --mesma redação seguida pelo programa. Lula substituiu a expressão "repressão política" por "violações de direitos humanos", o que agradou à cúpula militar.
Outro ponto que irritou os militares ficou presente no programa, já que o novo decreto estabelece mudanças somente nos temas referentes à Comissão da Verdade. Lula não retirou do texto o item que cria uma legislação nacional proibindo que ruas, praças, monumentos e estádios tenham nomes de pessoas que praticaram crimes na ditadura.
Lula assinou hoje o novo decreto, depois da polêmica que dividiu os ministros Nelson Jobim (Defesa) e Paulo Vannuchi (Direitos Humanos). O presidente encontrou uma solução de meio-termo, que agradou aos militares, mas também não se transformou num recuo total do decreto do final do ano passado que instituiu o programa.
Jobim disse hoje que se sentiu plenamente atendido com as mudanças, mas Vannuchi ainda não se manifestou publicamente sobre as mudanças.
Projeto
O decreto cria um grupo de trabalho para elaborar, até abril deste ano, um anteprojeto de lei que cria a Comissão Nacional da Verdade. O grupo vai ser integrado por representantes da Casa Civil e Ministérios da Justiça, Defesa, Secretaria de Direitos Humanos e um representante da sociedade civil.
A comissão terá como tarefas apurar violações dos direitos humanos, dentro do previsto pela Lei de Anistia, assim como promover a "reconstrução da história" nos casos de desrespeito aos direitos humanos. Também está prevista a "promoção dos meios e recursos necessários para a localização e identificação de corpos e restos mortais de desaparecidos políticos".
Pelo decreto, a comissão ainda terá que divulgar os seus procedimentos de investigação para garantir o "esclarecimento circunstanciado de torturas, mortes e desaparecimentos". Outro ponto sugere que a comissão apresente "recomendações para promover a efetiva reconciliação nacional e prevenir no sentido da não repetição de violações de direitos humanos".
Depois que o grupo de trabalho elaborar o anteprojeto de lei, o governo terá que enviá-lo para o Congresso --que precisa aprovar o texto para que a Comissão da Verdade seja efetivamente criada.